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16 maio, 2022

A Arte e a Barbárie nestes Brasis

 Ser ator no Brasil ainda significa estar disposto a lidar com uma quantidade enorme de consequências da falta de uma educação avançada e uma valorização real da cultura, que infelizmente mantém a maioria popular num limbo de preconceitos, conhecimento raso e, obviamente, falta de respeito, enquanto vítima da armadilha da mitificação da profissão. Haveria como ser diferente? A resposta é óbvia: claro que sim. No entanto, a estrutura social brasileira é tão frágil e calcada ainda num jogo desumano de capataz e serviçal, um bom figurino para disfarçar a mesma relação senhor de engenho e escravo de tempos idos (?), que se torna impossível esperar que a maior parte da população consiga de fato avaliar corretamente a importância da Arte e de outras profissões, não necessariamente da área artística, muito embora a Arte esteja em praticamente tudo em nossas vidas.

O que esperar do futuro do eterno país do futuro, que mais parece sem futuro, diante da falta de uma valorização real das aptidões das pessoas em seu processos individuais de educação, quando a própria educação, cujo princípio e proposta é até boa, mas foi sucateada pela corrupção tão vil que assola o Brasil desde sempre, não está voltada para o indivíduo e suas aptidões particulares?

É preciso que se humanize a educação, senão a maior parte de nós continuará no fundo deste abismo sombrio, olhando para cima, para os poucos bem-educados e cultos, uns se considerando quase deuses e outros presos ao complexo das impossibilidades; tudo isso parte de um espetáculo torpe, que mimetiza a real condição em que todos inebriadamente se encontram, num país eternamente de farrapos educacionais, institucionais, culturais e sociais, que vive o carnaval de que tudo está bem e - pior! - que se é o suprassumo da raça humana, muito embora se busque valorizar tudo que venha de fora, menos o que realmente vale a pena de ser copiado.

O Brasil é refém de si mesmo, de suas próprias armadilhas orgânicas, onde se deita em berço esplêndido, não necessariamente confortável, mas eternamente atado à preguiça de se fazer diferente, de se reformar, consertando seus defeitos, sempre calcado no indesviável humanismo e valorizando de verdade as tantas qualidades reais e preciosidades naturais que tem. 

Agora, essas e quaisquer outras mudanças na estrutura social só vão acontecer, quando cada indivíduo se responsabilizar e se dedicar em promover esta mudança em si e em seus próprios conceitos, padrões e paradigmas. A estrutura não muda, se a base - os indivíduos que a compõem - não mudar antes. Não existe milagre e nada vai mudar, se as pessoas que compõem a sociedade permanecerem escravas de (pre)conceitos e paradigmas inúteis, que não promovem um avanço em direção à empatia e a busca de uma vida melhor para todos.

E qual a importância do ator, assim como da própria Arte em si mesma, nesse processo? Ela é a "entidade", a vertente criativa, que nos mostra outros pontos de vista, que nos oferece a possibilidade de expandir nossas percepções, de entender melhor o quadro geral. A Arte nos convida a ir além de nosso diminuto e insuficiente ponto de vista diante da realidade, realidade essa, cuja abrangência é sempre maior do que podemos imaginar. Ir além de nossas próprias e costumeiras concepções, nos permitir entender essa crescente abrangência dentro de nossa capacidade também crescente de percepção, é a chave para continuarmos a crescer, a evoluir nesse processo o qual denominamos Vida.

06 outubro, 2015

Memórias d'O Tablado: Depois das férias

Lembro de certa vez, quando acabaram as férias e retornamos para o segundo ano de aulas no O Tablado. Cheguei mais cedo, deixei minha mochila num dos acentos e subi ao palco. Não havia ninguém lá, além de mim. Olhei ao redor, a bancada, as luzes, a coxia, a platéia... Uma sensação de certa felicidade, de satisfação por estar matando uma saudade espalhava-se por cada célula de meu corpo.

Dei alguns passos, senti o cheio de lugar antigo. Todos os anos de aventuras, músicas, estórias estavam comprimidos naquele lugar, cada um na sua dimensão própria de tempo, coabitando naquele mesmo espaço, num eterno apresentar-se, entre mundos e consecutivamente.

Então, chegou um colega de turma. Não lembro-me muito bem quem era... acho que era o Leandro Hassun. Ele percebeu de cara o que se passava comigo e soltou um comentário que virou a descrição perfeita do que aquele lugar especial estava se tornando para mim: - É bom voltar pra casa, né? 

Fiquei surpreso de uma forma diferente, como quem descobre aquela palavra que estava tentando lembrar, para descrever algo. A sensação de ver-se compreendido e de compreender a si próprio.

Pronto! Esse momento acabara de se tornar um ponto inesquecível de minha memória e que levarei comigo, como quem acaricia um bebê nos braços e, ao mesmo tempo, é acariciado por alguém que ama. Um ponto na minha história, onde lembro-me que sou um pouco mais humano.